Abuso psicológico

 



Contém gatilhos ⚠️

Ontem recebi uma mensagem que me deixou muito feliz (que até postei nos stories) mas, ao mesmo tempo com vontade de chorar por não corresponder à minha realidade, não neste momento. É muito difícil abrir isso e talvez esse seja o texto mais difícil e doloroso que já escrevi. Eu tenho 29 anos e um pai alcoólatra que mora comigo. Alguns amigos acham que ele é separado da minha mãe, alguns nem acham que tenho pai porque ele nunca está presente. Ele não está presente aqui, em nenhuma rede social. Ele nunca esteve presente na minha vida, ou pior, quase sempre quando se faz presente é um momento de conflito e dor. 


Desde que me conheço por gente, convivo com esse vício dele. Ele é do tipo que bebe e se torna agressivo. Não posso dizer que sofri outro tipo de agressões, apesar de alguns episódios durante a minha vida toda que envolveram até agressão física, mas aprendi que não importa a agressão, a dor e o dano trazem muitas consequências. Olha, não sei se para você é normal você ouvir quase todos os dias “você é idiota, você é imbecil”, não sei se para você é comum ouvir ofensas, ser chamada de v@gab*** ou coisas do tipo. Eu ouço isso, ouvi ainda ontem. Não sei se teu pai já te disse, no auge da raiva (falando para mim e minha mãe) “tomara que vocês morram de COVID”. Há bem mais, muito mais, infinitamente mais. Cabem tantas palavras em 29 anos. Não sei se é normal viver com medo, sentir um aperto no coração quando ele chega gritando no portão, se é normal não dormir em paz, se é normal só ouvir alguém te por para baixo, insultar, humilhar, relembrar coisas do seu passado, colocar em jogo sua fé, descontar todas as frustrações da vida nas pessoas que moram com você e até mesmo ameaçar. Isso tudo quase que diariamente. É desesperador se sentir impotente para mudar essa realidade.


Eu sei que quem vê minha mãe, irmã e a mim nem imaginam, muitas vezes, o que há por trás do nosso sorriso. Sim, nós somos mulheres de fé. Sim, nós já ouvimos a vida toda que Deus pode transformar, mudar, e eu não duvido do poder dEle. Sim, eu sei que tenho que perdoar, eu já pedi perdão para ele muitas vezes, já chorei a frustração de não conseguir perdoar, já não sei a diferença entre perdoar de novo ou se algum dia fui capaz de perdoar tudo de verdade. Só sei uma mudança vem de um lugar de escolha. E até hoje só vejo que todos os dias ele escolhe nos ferir ainda mais, e não somente a nós, mas seus irmãos, parentes, vizinhos, qualquer um que seja mais próximo. Sim, ele também tem dores e traumas, Deus sabe o quanto tentei entender. Mas nossas dores são motivos para ferir e traumatizar outros impunimente? A lei Maria da Penha está aí para provar que não. 


Este texto é um desabafo. Este texto é para dizer que cada sorriso desse feed é genuíno, mas a dor diária também é, o grito na minha alma também é. Este texto é uma dedução de que abuso psicológico existe, que a pandemia com certeza agravou tudo isso, e que existem em mim crises, traumas e medos que só mesmo Jesus pode me ajudar, mesmo na minha fé por vezes vacilante. Esse texto é para dizer que Deus é refúgio e que por Ele que podemos viver como se todo esse desequilíbrio no lar não existisse. É para enaltecer mulheres como a minha mãe, que tinham tudo também para se entregar ao sofrimento e sucumbir em meio a tantas ofensas, mas decidiram lutar e é infinita a minha gratidão por tudo que minha mãe, por tudo que ela já viveu e por tanto que ela já aguentou. Mãe, você é o meu melhor exemplo, minha heroína. 


Nunca fui de desabafar em redes sociais, mas eu decidi que minhas dores serão para ajudar a curar outras pessoas. Se você passou/passa por algo assim você não está só. Sabe, tem uma música que eu gosto muito que diz “toda dor é por enquanto”. Mas, quando está doendo, a dor parece eterna.

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